Tradicionalmente – se a uma prática com meia dúzia de anos se pode chamar tradição - as Companhias erigiam nos locais onde estavam aquarteladas um “monumento” que assinalava a sua presença. Na prática, aquelas pequenas construções tinham um significado equivalente aos dos padrões que os navegadores portugueses erigiram ao longo da costa africana durante a epopeia dos Descobrimentos, salvaguardando as devidas distâncias, como é evidente.
As fotografias que ilustram este texto foram-me enviadas pelo Jorge Isidoro, que foi furriel-miliciano da CCaç 1495, que nos rendeu em Fevereiro de 1966, tendo permanecido em Lucunga durante os 27 meses que durou a sua comissão. Nesta foto, que foi tirada de um ângulo mais favorável do que os de qualquer uma das fotos que eu já tinha do nosso “monumento”, o Jorge está de pé, enquanto, sentado, está o Antunes, igualmente furriel-miliciano daquela Companhia.
Monumento da CArt 738
Na fotografia podem ver-se, ao fundo, a oficina-auto e, em segundo plano, o mastro com a bandeira nacional (mais à direita vê-se também a casa do gerador que nos fornecia energia eléctrica, quando não estava avariado).
No espaço entre o mastro da bandeira e a oficina formavam todos os militares da Companhia, diariamente, às oito horas, para assistir ao hastear da bandeira.
"Casa dos Sete Magníficos"
Esta era a pequena moradia que foi a minha casa – e de mais seis camaradas - de Janeiro de 1965 a Fevereiro de 1966. Aqui, o “jardim” parece pouco cuidado. Deve ter faltado o cumbú* para pagar ao jardineiro.
A zona de intervenção das unidades aquarteladas em Lucunga abrangia uma vasta área na margem esquerda do rio Coji, pelo que, não havendo ainda a ponte o uso de uma jangada era indispensável para o cumprimento das nossas missões. Além do nosso pessoal, a jangada também era utilizada pela Companhia aquartelada em Chimacongo, que ficava cerca de 30 kms. a Leste de Lucunga, e cuja zona incluía igualmente algumas áreas na margem esquerda do rio.
Havia outros utilizadores, entre os quais se incluíam os grupos que então combatíamos, aos quais chamávamos terroristas ou, mais vulgarmente, turras (designações hoje politicamente incorrectas, como sabemos).
De vez em quando, ao chegarmos ao Coji a jangada estava encostada à outra margem. Atendendo ao facto de, no rio, além dos peixes e dos hipopótamos – estes numa zona um pouco mais a jusante – também nadarem crocodilos, antes de um voluntário atravessar o rio a nado para trazer a jangada, era preciso varrer a corrente com algumas rajadas de FN, e lançar duas ou três granadas, para afastar os indesejáveis animais. Claro que essa acção provocava aquilo que hoje se designa por “efeitos colaterais”: no caso, alguns quilos de peixes mortos.
Militares da CCaç 1495 atravessam o Coji na nova jangada
A jangada da fotografia foi reconstruída pelos militares que nos foram render. E, pelo aspecto, fizeram um excelente trabalho. Parece nova
* Dinheiro em quimbundo
Para todos os amigos que estão nesta jangada e que ainda se encontrem entre nós vai o meu grande abraço de saudade desses tempos magnificos que em Angola passamos juntos.um grande abraço do amigo Albino Pires 1º cabo rádiotelegrafista desta mesma companhia.
ResponderEliminarCaro Abílio Pires,
EliminarA sua Companhia foi render aquela a que eu pertencia, e apenas estivemos em Lucunga ao mesmo tempo durante uma semana. Por isso não me recordo de si, como certamente não se recordará de mim.
Assim sendo, decidi dar conhecimento do seu comentário ao Jorge Isidoro, que me enviou a foto da jangada, e que foi furriel-miliciano na sua unidade.
Abraço.