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sábado, 11 de junho de 2011

O Memorial de Belém (Pretexto)


 Monumento aos mortos da Guerra Colonial, com o Forte do Bom Sucesso ao fundo. 
Nas paredes do Forte foram colocadas as placas com os nomes dos nossos mortos

Ao ler, ontem à noite, a notícia da homenagem que os antigos combatentes prestaram aos camaradas que morreram em África, junto ao Memorial de Belém, em Lisboa, e no qual, quer os “chefes” militares, quer as primeiras “figuras” da Nação primaram pela ausência, decidi adiar a publicação do texto que estava previsto (e pronto) para sair hoje, e evocar a memória do Armando Fortes Conde, cujo nome consta daquele Memorial.

Conheci o Fortes Conde quando, em Outubro de 1954, cheguei, transferido de Coimbra, à turma C, do 3º ano do Liceu Gil Vicente, em Lisboa.

Tímido, sem conhecer ninguém, foi o Fortes Conde que começou por entabular conversa comigo, depois de me ter querido dar um calduço da praxe, logo à entrada do Liceu, na convicção de que eu era caloiro. Desfeito o equívoco, tornou-se no meu cicerone e foi-me apresentando ao resto dos colegas.


 Liceu Gil Vicente
(Hoje Escola Secundária Gil Vicente, e com outra cor)


Era um aluno com notas razoáveis, mas muito irrequieto e que, dotado de grande sentido de humor, estava sempre pronto para uma brincadeira.

Lembro-me dele a contar-nos - caricaturando os tiques de Américo Thomaz e dos seus acompanhantes -, as peripécias meio ridículas, a que ele emprestava uma boa dose de comicidade corrosiva, da abertura oficial das aulas no Instituto de Odivelas, a que tinha assistido com os pais porque a irmã era aluna daquele Instituto.

Ou do descaramento com que, brincalhão, se metia, no Largo da Graça, com as alunas da Escola da Voz do Operário, atrevimento que, de vez em quando, pagava levando com a pasta dos livros delas, por onde o apanhavam.


 Aeroporto de Luanda

Depois de sair do Liceu, estive alguns anos sem notícias dele. Reencontrei-o uma única vez, por mero acaso, em 15 de Novembro de 1965, no Aeroporto de Luanda. Eu chegava de Lisboa, onde estivera de férias, e o Fortes Conde esperava um dos passageiros que, salvo erro, lhe levaria uma encomenda. Fizemos uma festa, com toda a gente a olhar para aqueles dois tipos que pareciam malucos.

Fomos tomar um café apressado no bar do Aeroporto, porque ele tinha que saltar para a moto e seguir para a Barragem de Cambambe, onde estava aquartelado o pelotão que comandava.

Trocámos números de telefones para nos encontrarmos depois do regresso a Lisboa.

Voltei a ouvir falar dele no Grafanil quando, no final da comissão de serviço, os Batalhões, entre os quais o meu, formaram para a cerimónia da despedida. Um momento marcante destas cerimónia acontecia quando eram chamados os nomes de todos os militares que tinham morrido durante o período da comissão. A cada nome citado, respondiam, em uníssono, todos os militares, “Presente!” 

 
Barragem de Cambambe

Já comovido pela evocação dos militares do meu Batalhão que tinham tombado em combate, desfiz-me em lágrimas, perante o espanto dos que estavam próximos de mim, quando foi chamado o nome do Armando Fortes Conde.

Depois da cerimónia, os camaradas da sua unidade infomaram-me que ele morrera num acidente com a sua motocicleta. Quando regressava de uma das suas vigens a Luanda despistou-se ao sair da estrada Luanda/Nova Lisboa, provavelmente em excesso de velocidade, e foi embater na placa que sinalizava o desvio para a Barragem. Morreu no local.

Quando eu morava em Lisboa, muito perto da Torre de Belém, visitava de vez em quando o Memorial aos mortos da nossa guerra. O Fortes Conde não era o único que conheci naquela longa lista. Mas a sua morte marcou-me de forma muito particular.

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