Já
referi em textos anteriores, que a “simpatia” que o capitão
Carvalho – que foi o 4º e último comandante da CArt 738 – tinha
por mim o levava a encarregar-me de todas as missões de serviço que
saíssem das habituais rotinas.
Se
eu fosse um tipo crédulo ou convencido, poderia acreditar que essas
tarefas me eram atribuídas porque envolviam “projectos especiais”,
eventualmente de elevada responsabilidade. Não era o caso. A
intenção, às vezes conseguida, era mesmo a de me chatear; uma
espécie de castigo, com origens que nunca consegui descobrir,
porque, em boa verdade, à excepção do episódio que já aqui contei, não
houve qualquer ocorrência que justificasse a sua
implicância comigo.
Ebo
Foi
neste contexto que, mais uma vez, num fim de tarde de uma data que
não consigo precisar – algures entre Julho e Outubro – me mandou
chamar para me encarregar de um desses serviços “especiais”.
O
administrador de posto do Ebo (?) comunicara que um militar do
Regimento de Infantaria de Nova Lisboa (RINL), que tinha estado a
gozar um período de férias naquela localidade, de onde era natural,
não tinha regressado à sua unidade, pelo que resolvera detê-lo na
prisão local. A minha tarefa consistia em ir buscá-lo e, sob
prisão, conduzi-lo até ao RINL.
Nova
Lisboa-Av. 5 de Outubro
Na
manhã do dia seguinte, bem cedo, saí da Gabela, com um cabo e dois
soldados, além do condutor do Land Rover com destino ao Ebo, onde
recolhemos o jovem militar.
A
meio da tarde chegámos a Nova Lisboa e, depois de procedermos à
entrega do nosso passageiro, e de uma rápida volta pela cidade, que
não conhecia (e que incluiu um ligeiro atrito – rapidamente
resolvido – com uma patrulha da Polícia Militar), iniciámos o
regresso à Gabela.
Alguns
quilómetros depois, já a noite tinha caído, parámos no Alto Hama
para jantar, desta vez num restaurante, já que a ementa do almoço,
tinha constado das vitualhas embaladas na caixa da ração de
combate. Despachados os bifes com batatas fritas, ovos estrelados e
as indispensáveis Cucas, seguimos viagem.
Alto
Hama
Poucas
horas depois, o Land Rover deve ter-se sentido cansado e não andou
mais. Ficámos algum tempo à espera até aparecer um camião a quem
fizemos sinal de paragem. O motorista parou e com uma lanterna –
que nós não tínhamos – foi espreitar o motor e ver se podia
ajudar.
Quanto
à reparação do motor nada pôde fazer; mas ajudou dando boleia a
um dos meus companheiros de viagem até Santa Comba, no Colonato da
Cela, onde estava aquartelada a CArt 740.
Durante
a noite quase todos os condutores dos camiões que iam passando
paravam, solidários, procurando ajudar-nos.
No
dia seguinte, ao fim da manhã, e depois de uma noite mal dormida,
chegaram os camaradas daquela Companhia, que, na impossibilidade de
resolverem o problema no local, rebocaram a viatura avariada até
Santa Comba.
Colonato
da Cela
Há
males que vêm por bem. Como a reparação do Land Rover acabou por
demorar dois dias, aproveitei por conhecer a localidade e parte do
Colonato.
E,
numa loja local, que era uma mistura de livraria e discoteca (*),
comprei dois discos: o “Strangers in the night”, do Frank Sinatra, que era (ainda é) um êxito
editado nesse ano de 1966, e o “Capri c'est fini”, do Hervé Vilard, que embora fosse de 1965,
continuava muito popular entre a juventude.
Dois
dias depois regressei à Gabela. Os discos foram tão bem acolhidos
que, tendo andado de mão em mão, entre civis e militares, acabaram
por lá ficar, quando, em circunstâncias atribuladas, parti
inesperadamente da cidade.
(*)
Nota para eventuais leitores mais jovens: nesse tempo as
discotecas eram lojas que vendiam discos; os lugares onde nos
divertíamos à noite, chamavam-se “boites”.
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